INTRODUÇÃO À CRÍTICA LITERÁRIA
Por Rômulo Giácome Oliveira Fernandes
O presente texto é um esboço resumido de algumas atitudes metodológicas que o Crítico deve possuir frente ao objeto estético verbal, levando em conta toda a diversidade de correntes críticas e variáveis metodológicas.
a) Desdobrar a obra do ponto de vista dos “sentidos”, propondo releituras e revisões interpretativas, relatando estas leituras através de meta-textos;
b) Averiguar e descrever a qualidade da obra segundo parâmetros centrais da crítica literária atual.
Estas ações estão pautadas na estratégia e postura central da ciência TEORIA DA LITERATURA: a análise literária. Através desta, poderemos desmontar o texto, procurando diagnosticar os recursos / terminológicos logo abaixo citados.
2. A questão da qualidade:
2.1. A qualidade enquanto “constructo”; matéria verbal trabalhada de modo a propiciar as categorias centrais estudadas pela Teoria da Literatura: (eis abaixo as terminologias que são componentes operacionais “identidades” que a análise propicia diagnosticar)
a) Modulação: (capacidade de abstração do signo; do denotativo para o conotativo) Iuri Lotman; Greimas
b) Literariedade: (relação harmônica do sentido com a forma; a beleza estética da escolha e combinação para erigir sentidos múltiplos) Ezra Pound e Terry Eagleton
c) Polissemia: (uma obra aberta e neutra do ponto de vista semântico; sem necessidades de compreensões literais e possibilidades de múltiplas escolhas e substituições) Greimas e Todorov.
d) Significação: (a potência de relacionar-se com determinado contexto elocutório e significativo e a partir dele conseguir manter-se nova e renovada, apontando novas possibilidades culturais, antropológicas, teóricas e interpretativas); Roland Barthes
e) Função Poética: (a relação entre o eixo da seleção e o da combinação verificando a literariedade deste processo, bem como se a função dominante é a poética ou metalinguística)
2.2. A qualidade enquanto sistema representativo de dada cultura (manifestação humana) e histórica na confecção do discurso da humanidade:
a) Performance do Signo: Seu poder de diálogo com outros signos dentro do sistema poético, possibilitando relações multi-dimensionais;
b) A representação do discurso: se o discurso possibilita referências com outros discursos prontos ou não, evidenciando o caráter de hipertexto da teia verbal; (o sentido de um texto é outro texto; o sentido de um signo é outro signo).
c) Coesão Semiótica: ao nível da teia e signos e semas, a existência de coesão das células semânticas entre si;
a) Fanopeia: beleza das imagens (descrição); caráter inovador das imagens, coerência imagética, acabamento visual;
b) Melopeia: beleza da sonoridade; criatividade nas harmonias; possibilidade de sentidos e grau estético dos ritmos (pontuação, cadência dos versos, classificação das rimas, numeração tônica); relação do sentido com a “música” do poema;
c) Figuras de linguagem: acabamento na confecção das metáforas e alegorias; uso dos símbolos; as metonímias; figuras de inversão;
2.4. A qualidade do texto enquanto ente fundado no “cânone” estético; (Harold Blom, Yale, 2004)
a) Perceber relações do texto com um cânone estético, possuidor de características literárias, históricas e sócio-culturais; definir qual é este cânone;
b) Detectar e descrever as relações existentes entre o poeta analisado com autores específicos do cânone a que a obra reside; (fazer contraponto com um ou dois autores)
c) A qualidade do texto estará determinada pelo “uso” do cânone poético com suas variáveis:
a. O autor conseguiu manter coerência a um cânone; esta verossimilhança canônica propiciou ao autor qualidade de manutenção dos atributos básicos da poesia naquele momento;
b. O autor evoluiu e inovou seu cânone; trouxe a tona novos procedimentos e novas visões poéticas; sua qualidade estará analógica a seu valor de inovação e transcendência à norma estética;
c. O autor está à margem e inferior ao seu cânone; sua obra reproduz um censo-comum, com quantidade exorbitante de clichês poéticos que estão desatualizados e não causam estranhamento;
d. O autor não possui cânone aparente; a semiose destitui a obra de não estar ancorada em algum cânone; ou temos um mix canônico ou uma obra primitiva, sem embasamento formal e poético de construção;
Existem muitas maneiras de construir um discurso crítico. (a resultante de todo este trabalho crítico). Por não existir fórmulas perfeitas, algumas dicas tornam-se relevantes:
a) O discurso crítico possui um juízo baseado em valores muitas vezes parciais. O DC deve apresentar a obra ao leitor, mostrando o que ela possui de sentido (via de sua interpretação no meta-texto) e indicando sua potência de significação (o que ainda podemos extrair dela); deve reapresentá-la em suas características positivas e também negativas, apresentando neutralidade; cabe ao leitor ponderar sobre os atributos dados pelo DC e concluir se a obra é boa ou ruim;
b) Quanto mais sentidos um crítico consegue extrair da obra, teremos mais possibilidades do leitor evoluir o processo; o crítico é o primeiro a “garimpar” o texto; as pegadas deixadas por seu trabalho conduzirão a novas hipóteses do leitor; nunca o DC deve fechar a obra a outras interpretações, mais sim motivá-la e incitá-la;
c) O crítico é o primeiro a divulgar uma obra; muitos leitores leem o texto pelos olhos do crítico; criar estereótipos prejudica o processo de significação; por outro lado, propiciar ao leitor comum maneiras mais fáceis de abordar a obra é latente; o crítico sempre deve ser um divulgador e empolgado pela obra, um admirador da qualidade.
d) A linguagem deve ser objetiva e clara; acessível a todas as categorias verbais e culturais; esclarecer os critérios apresentando as provas (análises) e diagnosticando a qualidade segundo padrões lúcidos e informativos.
Comentários
Obrigada!
Larissa
É possível, sim. Chama-se Análise do Discurso de linha francesa. Um bom teórico dessa linha é Dominique Maingueneau.