LITERATURA DO ESGOTAMENTO OU LITERATURA DA PLENITUDE?

por Rômulo Giacome de Oliveira Fernandes

Se a arte rompe os fins dos tempos em busca de algo para imitar, a tendência pós-moderna é acreditar qua a própria imitação é matéria de ficção; A ficção por sobre a ficção; tendo em vista que o universo real é uma ilusão; Esta estratégia de auto-devoração, faz com que toda obra se auto-referencie; e nesta teia de re-criações, o novo não surja no produto, mas no processo.
Para Linda Hutcheon, existem os termos MIMESE DO PRODUTO e MIMESE DO PROCESSO; o primeiro é a realização da imitação do "real"; das personagens, da verossimilhança, dos objetos; no segundo caso, é uma imitação do processo de invenção, mostrando os códigos, os recursos, as marcas que ficam escondidas quando do ato da leitura; é uma espécie de Narcisivação (Narciso) do processo de fazer, de compor, de apresentar; o artista tem a obrigação de agregar ao seu texto o processo de composição, o modus de escrever, as marcas utilizadas;
O resumo de Jonh Barth faz é emblemático:
o romance realista tenta reproduzir o mundo que PARECE SER;
o romance modernista o mundo que PODERIA SER;
o romance pós-modernista o mundo NÃO PODERIA SER;

Esta retórica do ato de compor, esta situação enunciativa, de mostrar o eu enunciador, de mostrar sua técnica e processo de escrita, é produto da tendência a metaficção;
A arte fragmento, ou a meta ficção afirmada por Patricia Waught "o termo dado à estrutura ficional que consciente ou sistematicamente chama a atenção para o seu status de artefato, a fim de levantar questões sobre a relação entre ficção e realidade. Ao promover a crítica de seus próprios métodos de construção, esse tipo de escrita não apenas examina as estruturas fundamentais da narrativa de ficção, como também explora a possível ficcionalidade do mundo exterior, fora do texto de ficção literária"

A grosso modo, percebemos que a arte dos novos tempos está sempre vontando-se para o "fazer" em detrimento de um "representar" somente; esta busca pelas raízes da criação poética, na medida que a ficção se auto-discute, promove o que fala no campo da ruptura: a discussão da linguagem artística.
Em outro momento, nos questionamos se a relação entre o real e o ficional é costumaz, partimos do princípio do espelhamento: fazer uma ficção usando como "real" uma outra ficção, faz da primeira uma eventual realidade primeira; por outro lado, a realidade que acreditamos, também é produto do nosso olhar, e portanto também é ficção. Falar de um personagem em um livro, que já foi personagem de outro, pode produzir o efeito de sentido onde o primeiro passa a ser a referência real para o segundo. Acreditamos nas próprias ficções.

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O ruído dos novos tempos já vem surgindo com a microfonia de toda polifonia; os ruídos que lampejam a esfera da enunciação, surgindo outras vozes, novos locutores, novas enunciações que se entrecruzam, disfarçadas em grunhidos, gemidos, micro-sons e sonoridades; ruídos que são senão signos do tempo por vir; da dissonância e participação do lacônico; da oposição ao silêncio;
Na música pós-Jonh Cage, o rock refletiu bem esta máxima com a banda Jesus and Mary Chain; síncopes; sonoridades em dissonância; amargas eletroacústicas; onde existe polifonia, tem microfonia; esta forma de propor um choque, uma ruptura dos sentidos, das formas de percepção, atingem a mídia que procura a multifacetação; o caleidoscópio de referências; uma espécie de estética-suja;

DICA: banda Jesus and Mary Chain - PsychoCandy - 1985.





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POEMAS MICROFÔNICOS
Rômulo Giácome

SOADA A USINA DE IDÉIAS,
O APITO DA FÁBRICA RUGE COMO A VACA DO SACRIFÍCIO
RUMINANDO DORMINDO SOFREGANDO E GEMENDO
ALTAS VOZES NA PRAÇA NO AUTOFALANTE GRITANDO E CORRENDO
PASSOS LENTOS DE LÃ EM BUSCA DA CHAMA QUASE APAGANDO
E O VENTO BATENDO A LATA NA LATA O CARRO QUE CHOCA
E O BEBÊ ABERTO NA CAMA SORRINDO E DORMINDO
COM O AVIÃO DECOLANDO ESGOLEANDO O OUVIDO
ESTUPRANDO A ALMA QUE EXPLODE EM CACOS DE METAL

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ENCONTRO

CAPITU E LUCÍOLA NA ESQUINA
ONDE O VENTO SOPRA OS CABELOS DE AURÉLIA
PENSATIVA, ELA ANOTA A VISÃO
DE IRACEMA CORTANDO A CORDA DE TIRADENTES
E GRITANDO A PARAGAÇU QUE PARE, DESÇA E CANTE

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DECAPITADAS EM QUARTOS ABERTOS AS IDÉIAS VOAM COMO MARIPOSAS
BRAÇOS DE CÓCORAS ABRAÇANDO RÉSTIAS PERDIDAS DE
LUZ
E EM TODO O MEIO DE PASSOS E ECOS QUE NÃO DIZEM NADA

GRITOS

DISSOLVEM-SE EM NEVE A PELE QUE COBRE TUA BELEZA
DO CACO DE VIDRO QUE PASSA E CORTA
NO BRANCO O FIO DE VERMELHO

GRITOS E GRITOS

CAROÇOS EXPULSOS PELA FRUTA QUE EXPELEM O SEIO
SELADAS AS BOCAS CONTEMPLAM
OS GRITOS E ECOS SURDOS

E NO MEIO O TOTEM
ABRINDO O SORRISO EM DESARMONIA

CANTOS

GRITOS


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VOA EM COMPASSO A VONTADE CARREGANDO A VIRTUDE
CORTANDO MOVIMENTOS E ASSINALANDO NO AR A PASSAGEM
DO VENTO EM DISSONÂNCIA COM O DESTINO RECORTANDO
PEDAÇOS DE CACOS DE VIDA AMARRADOS EM LINHAS DE PIPA
QUE SOLTAS VOLTAM NAS MÃOS DAS CRIANÇAS.


AS MÃOS AFAGAM OUTRAS MÃOS QUE TECEM O FIO DO MANTO DA MORTE AFAGA A FACE E OS OLHOS FECHADOS QUE APERTAM A MÃO DO SONHO
ABRINDO OS DENTES E RECEBENDO O TOQUE DA ÁGUA SORVIDA DA TERRA ABARCA COM UM TOQUE A VONTADE DE MIM E A VONTADE DE SI

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PORQUE ESCOLHO? POR QUE TENHO ESCOLHA!

No debut da cultura de informação, nada melhor que encarar a mídia como um grande cardápio; um cardápio recheado de boas dicas, barato, alimentos nutritivos e realmente sofisticados; mas também a perspectiva de ter que escolher entre pratos enganadores, sem sabor e caros; Se escolho é porque tenho escolha; Mesmo que esta escolha não seja tão diferente quanto se imagina; Tecnicamente a maior escolha é feita pelos sujeitos construtores dos signos que nos esbaldamos; nada é constituído por acaso; tudo possui uma afetação pragmática, moldada dentro de objetivos bem definidos e delineados.
Este caráter seletivo e configurável do plano enunciativo da mídia, tal qual um móbile que merece movimentos até o acerto, é premissa para um estudo semiótico. Em primeira instância a possibilidade de configuração e advinda do caráter flexível da linguagem e suas ramificações, o que naturalmente impele a eternas configurações. Por outro lado, saber que mudar exige a consciência de um “por que” mudar e “para que” mudar, surge a perspectiva do trabalho semiótico: ter a consciência de um leitor em potencial, virtualmente preconizado e avalizado, de modo a que intendamos suas perspectivas, necessidades e desejos. O mistério todo se constitui do telespectador encontrar algo que goste e deseje, sem ao menos ter pedido. Isto propicia uma valorização ao canal, ao jornal ou até mesmo ao blog que fez o que se precisava e era de interesse fazer. A comunicação popular, ou mass media, é um mistério e uma química, mas como todo mistério, existem códigos já utilizados que dão certo e que servem como velhas fórmulas mágicas de audiência. Algumas pedras de toque como o imaginário infantil, coletivizado e icônico, cheio de cores e coreografias, permitindo a fluição de energias ao cenário Pop Juvenil são fórmulas já desgastadas. Os programas de auditório, conservadores sobre o ponto de vista da mesma estrutura, das mesmas âncoras, não constituem mais elemento de ruptura, nem ao menos o voyerismo ou nudez consumada, ainda que esta não se consolidou totalmente como gênero convencional. O que permite uma abordagem semiótica é a premissa da categoria conflito real como força motriz de audiência: o momento que lágrimas vertem na intimidade aberta e deflagrada no Faustão; brigas de opiniões do naipe do Saia Justa ou até mesmo no programa altas horas; como exemplo específico poderíamos utilizar dos recursos semióticos para manipular os dados que temos em uma grade de programação. Primeiro encaramos convidados de um programa de auditório como signos em potencial, que em seu momento paradigmático, por si mesmo e por toda a carga de representação, funcional como representamens de uma dada situação social, cultural; poderíamos propor convite à um diretor de teatro; daríamos a falsa impressão de intelectualidade, tendo em vista que abaixo da teledramaturgia não temos mais nada, e o teatro soa como um desencargo de consciência dos pseudo-socialistas artistas globais, que o procuram como mascaramento da vida abastada, dos textos absurdamente simples e mal adaptados, da falta de contato social, da proximidade efetiva com as massas que os levam ao topo; falar em teatro onde a cultura é vista como um espólio capital, o cenário televisivo, é agir em prol da “nossa” sociedade; pois bem, escolher um membro efetivo desta elite teatral, um ícone rebelde e imolestado pelas tentações e vícios da fraqueza anti-artística; por toda esta plataforma escolheríamos Gerard Thomas; seu suposto engajamento daria-nos apoio por parte da elite pensante; mas precisaríamos que ele tivesse tido respaldo popular; logo lembraríamos quase que inconscientemente que este diretor já havia tirado às calças e mostrado a bunda a pessoas que o vaiaram, o que mostra que ou era uma demonstração de liberdade de expressão, ou a liberdade de expressão de vaiar algo deva ser condenada com uma bunda horrível. Um diretor de teatro mal humorado, que se encontra disposto a achar que é dono de um saber-fazer seria importante para ornamentar um programa de procura por status ideológico. Agora, quem colocar em oposição? Uma modelo, manequim, alguém que serve com o corpo para a moda? Alguém que torna-se símbolo da (i)representação no momento em que o rosto, a expressão, tem que manter-se em estado de suspensão, limitando-se a ser a alegoria de uma tendência da moda? Mas, e se essa modelo inferisse no mundo da dramaturgia; quisesse ser artista, atriz, representar, sugerir emoções, povoar a TV de riso e choro? E se essa atriz não tivesse obtido sucesso, tendo uma representação / atuação considerada fraca pela mídia e levasse uma novela considerada membro direto do Teatro (novela Bang Bang) ao fracasso? Bem, Fernanda Lima seria essa pessoa; desconsiderada pela crítica, amaldiçoada pelos telespectadores; uma química bem interessante: uma atriz frustrada e um diretor “engajado” boca do inferno; Estabelecidas as convenções nesse micro mundo da ficção, onde opinião tem peso de ouro, principalmente vinda da boca de alguém que supostamente é alguém; Dado esse cenário e contexto: pedimos ao quarto poder que ceda espaço aos outros poderes que manipulam nossa mídia; mais quais?

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RESENHAS TARDIAS: PORQUE NEM TODO MUNDO COMPRA PÃO ÀS 6 DA MANHÃ;

SNOW PATROL: UM NOVO AUDIOSLAVE OU A COMPETÊNCIA DO POP EM SER VICIANTE?





Exuberante; bem, com uma referência assim não posso partilhar de critérios negativos. Já matei a crítica pelo pescoço. Mas, a grandiloqüência sempre foi marca do Pop/Rock; então, porque não sê-lo? Há tempos o rock “generale” precisava de um sopro de vigor; sair da onda minimalista do vocal melódico, ou do “cult” dos experimentos indies ou pós-indies, ou death-indies, hahah; bem, o que temos é um excelente debute que pode ser acessado no carro, em casa, ou pela própria percepção; Snow Patrol é Rock Pop, com muito respeito ao trabalho artístico; na crescente “Make this go on Forever”, que cresce descomunalmente e sobe para um refrão que insiste em continuar, mantendo o prazer milimétrico de uma boa melodia ainda presente, presente, por mais um pouquinho, mais um pouquinho, até que há;;;;!!. Já em “Hands Open”, hit gratuito e fortuito, não há que discutir; o segredo da música está justamente na, (...) música!!!hahah. Snow Patrol compartilha experiências irlandesas em um cenário cosmopolita; nascido de um berço que incita uma relação com U2, é claro que não poderíamos deixar passar “Beginning To get To me”, que mantém a guitarra perdida no meio da bateria ascendente, e o vocal acompanhado do riff básico; em suma, MARAVILHOSOMENTE U2; não se deixem enganar por mentes ardilosas que negam o Pop; muitos destes habitantes do planeta de All Star, que assistiram Diários de Motocicleta e se dizem conhecedores de Che Guevara, não passam de enviados do Demônio para expelir nossa bondade Pop, a comunhão, o compartilhar nosso gosto musical;;;
Bem, medir a capacidade semiótica da música Pop é perceber o quanto ela pode ser viciante; terminarei logo esta resenha para escutar...ops, thau.

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