CONSTRUINDO UMA METODOLOGIA DE APLICAÇÃO SEMIÓTICA NA ARGUMENTAÇÃO POR DANO MORAL


Por Rômulo Giacome de Oliveira Fernandes

A partir dos pressupostos abaixo, considerando o uso dos sememas e seus sentidos como valores de um jogo que jogamos dentro da linguagem e do discurso jurídico, buscaremos configurar uma metodologia de análise semiótica, fazendo uso da linha Francesa e Semântica Estrutural, para compreender melhor o uso das palavras na argumentação que objetivam as ações específicas de Dano Moral.


Pressupostos da teoria
    

       Toda movimentação linguística é passiva de efeito semântico; a palavra escrita ou prolatada, sua união com outras palavras produzem alteração da carga de sentido ao destinatário;
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    Levando em conta os actantes que agem na linguagem, quando um sujeito ganha um objeto, ele é alterado por este e ocorre modificação de sentidos; a alteração de situações deflagra mudança de percepção de valores; quando o sujeito perde a relação com algo ele também sofre variações de sentidos; quando um sujeito age sobre outro sujeito, ocorre carga semântica; em suma, os sentidos surgem da transformação de realidades linguísticas provocadas pelos actantes, ou seja, sujeitos do discurso. 
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      Uma carga de sentidos é percebida por um sujeito cognoscente essencial, virtual e ideal, mas também subjetivo. A escrita ou fala argumentativa sempre está focada em um destinatário, construída sobre lentes e filtros dos leitores ou telespectadores; a carga de sentidos pode ser percebida pela denotatividade (aspectos imutáveis do idioma); também pela conotatividade (virtuais, na medida que surgem de um relacionamento ocasional entre as palavras). Por exemplo, a carga semântica de /nojo/ surge do evento semiótico relacionando palavras /suco/, /lesmas/ e /liquidificador/.  
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    As palavras tem carga valorativa negativa ou positiva, intensa ou superficial; o termo “vilão” e “traição” possui carga valorativa negativa; os termos “lealdade” e “amizade” tem carga valorativa positiva. Claro que perante uma gradação e referência cultural moral; a carga de gradação está filiada ao tipo de valor semântico imposto: falecer, morrer e bater as botas; níveis de gradação semântica, do intenso para o superficial, na linha da delicadeza ou não;
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      As palavras podem transmitir “semas”; o contato da palavra com outras palavras afeta sua carga de sentido, por aquisição ou privação de significados; assim como o exemplo icônico, quando afirmamos: o Pedro da farmácia ou Jorge bom de bola; ou o Lúcio o mascarado; “está tudo cinza sem você” a contaminação da cor para desenhar a ausência;
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    Advindo do poder da palavra é imprescindível na prática jurídica a escolha dos lexemas portadores de sentido, levando em consideração o eixo de seleção (paradigmático) e eixo de combinação (sintagmático);

      O poder das palavras na argumentação jurídica está alinhado às possibilidades do semema, ou seja: a) do sentido natural da palavra em seu universo jurídico, por exemplo, “dignidade humana”, que já possui seu papel e lugar no discurso jurídico; b) dos sentidos virtuais que as palavras podem obter na cultura do direito, ou seja, em seu contexto de uso. As palavras /acidente/, /eventualidade/, /fatalidade/ podem construir uma linha semântica de argumentação que conduz à não intencionalidade. Ou seja, a fuga do dolo (intenção de agir).
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    Na prática jurídica da escritura de sentenças e argumentos existem valores semânticos para palavras que podem conduzir às decisões. Levando em conta o dano moral, o lexema /tristeza/ pode ser entendido como mero aborrecimento, com um nível semântico na escala do convencimento sobre danos morais muito baixo; por outro lado, o lexema /trauma/ pode apresentar um ótimo nível semântico na escala do dano moral, com possibilidade de ganho;

    A linguagem promove a representação do real; como não apreendemos a factualidade jurídica a partir do “real” e sim a partir de discursos compostos por palavras (petição argumentativa, contra-argumentações, alegações, testemunhos) o texto e sua linguagem tornam-se uma das formas principais de acesso à realidade; por outro lado, existem efeitos negativos nesta presentificação do real, pois a linguagem pode ser configurada como “filtros” que modificam a realidade ao sabor do valor, sentido contextual e natural das palavras, bem como do seu uso, contexto e impacto.

    A realidade jurídica construída pela linguagem pode sofrer alterações dos filtros em aspectos variados: da perspectiva da factualidade tentando a neutralidade (impossível, pois todo signo é ideológico); buscando a tergiversação, ou seja, minimizar um outro discurso; ou também manipulador (levar a uma outra esfera de sentido que seja aquisitiva ao saldo final positivo).


Esquema analítico


A partir dos pressupostos acima, considerando o uso dos lexemas e seus sentidos como valores de um jogo que devemos jogar dentro da linguagem e do discurso jurídico, buscaremos configurar uma metodologia de análise semiótica, fazendo uso da linha Francesa e Semântica Estrutural, para compreender melhor o uso das palavras na argumentação exitosa ou não, objetivando as ações específicas de Dano Moral.
Como seria configurada esta Metodologia?
Primeiramente temos uma hierarquia de valor impressa pelo ordenamento jurídico.  Estas palavras não representam em absoluto o espectro jurídico, mas são excelentes parâmetros para início do nosso paradigma, ou eixo de referência semântico.
Juridicamente, o que temos de unidade semântica imprescindível é que os Danos Morais tratam dos direitos da personalidade. Logo, o dano moral terá um direcionamento semântico mais do que relevante: Configurar-se-á Dano moral aquele que incidir sobre o dano “imaterial”, desclassificando todo dano “material”. Para fins descritivo semânticos, isto já é um imenso filtro, pois estamos lidando com referentes subjetivos e abstratos.
            Abaixo seguem alguns lexemas retirados de julgados, doutrina e sentenças, que podem definir um pequeno e ainda impreciso eixo semântico de referência.

Honra
Imagem
Nome
Intimidade
Privacidade
Julgado ver

Segundo a teoria Greimasiana, devemos construir um eixo semântico de análise, a partir da contraposição, pois como o sentido surge na diferença, faz-se necessários os processos de conjunção e disjunção.
Devemos construir um eixo de contraposição entre os sememas para distinguir seus sentidos. Observando abaixo:

Honra
Relógio

Ao contrapormos o semema /honra/ e /relógio/ podemos perceber um sentido de repulsão, ou seja, disjunção entre os dois, em virtude semas como a natureza de cada um: honra é imaterial e relógio é material.
Por outro lado, se realizarmos a relação abaixo:
Honra
Dignidade

Veremos que semanticamente existem semas que se comunicam. Fagulhas de sentido como /valor/, /valor social/, /nome/ surgem criando conjunção entre os sememas.
Analisando operacionalmente, existem sememas que podem intensificar ou não a relação de conjunção entre os termos que interessam. Assim, para a argumentação jurídica, é salutar encontrar os termos desta relação que possuem valor conjuntivo, ampliando a possibilidade de persuasão.
Evoluindo no raciocínio, cada palavra acima irá eclodir um campo semântico, pois elas constituem-se sememas, dotadas de semas de classe e virtuais:
Um conjunto de semas que irão se comunicar com os semas dos sememas ideais ou não. Existiram sememas ideais, que surtem efeitos, e os sememas que não cumprem os efeitos desejados.
O que denominamos campo semântico em nosso estudo? A possibilidade do semema evocar todo o conjunto de semas naturais que possuem, bem como codificar e imprimir valor de sentido a outros semas virtuais.
            Acompanhe o exemplo abaixo:
O semema /honra/ nos leva aos classemas: “público” e “avaliação”. Ou seja, a honra está intimamente ligada ao valor que outro nos atribui. Assim como:
- Imagem
- Nome à
- Intimidade à
- Privacidade à
Apresentam classemas que surgem da relação entre os sememas eleitos pelo discurso jurídico, como: /público/ e /terceiros/
De um modo geral, todos os sememas do nosso eixo de referência citados acima estão conectados a valores sociais, valores de terceiros, avaliação de terceiros, que se materializa em semas como: “julgamento”, “valor”, “terceiros”, “público”, “sociedade”, “outros”.

metodologia:

aa) Definir os termos-objeto (sememas) referência eleitos pelo ordenamento e discurso jurídico para construir um eixo semântico de referência, ou seja, a linha de base por onde irão ser confrontados os sememas ideais ou não para a argumentação.
bb) Pesquisar alguns julgados (sentenças e petições) com resultados negativos e positivos, para analisar os êxitos e poder depurar os sememas ideais e os sememas excluídos.



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