A CONCEPÇÃO DE JUSTIÇA EM SÓCRATES

A CONCEPÇÃO DE JUSTIÇA EM SÓCRATES A PARTIR DA PEÇA "ANTÍGONA" DE SÓFOCLES
Rômulo Giacome
1.1 Perfil filosófico de Sócrates (469-399 a.C)Filho de Sofrônico, escultor e Fenáreta, parteira, nasceu Sócrates, 469 anos antes de Cristo, em Atenas. Moldado pela reflexão e pela cultura helênica de Péricles, Sócrates foi um rígido Magistrado e valoroso soldado. Não participou ativamente da vida pública, mas sua convicção na força das polis lhe rendeu méritos filosóficos.


Segundo H. Pandovani e L. Castagnola[1] Sócrates dedicou-se às questões práticas da espiritualidade e ao mundo humano e sua dimensão moral. Ele se apresenta cético em relação à metafísica. Para o filósofo, as questões práticas devem ser abordadas e conduzidas aos valores universais. Os vetores principais de sua filosofia podem ser condensados na perspectiva da gnosiologia e da ética, sendo que o fim da filosofia é a moral.

A gnosiologia de Sócrates partia de um método dialógico, de perguntas e respostas, bem como da maiêutica, faculdade epistêmica pela qual ocorrem os partos da alma, ou o saber propriamente dito através do diálogo e da ironia. É fundamental ao conhecimento o voltar um olhar para si.

1.2 A concepção de Justiça em Sócrates

A filosofia tanto tem demonstrado seus métodos de investigação a cerca da realidade empírica e ainda material, quanto em pontos capilares da conduta humana e que não estão mensurados através da realidade tangível. Princípios como moral, virtude e ética não podem ser delineados sobre a forma da materialidade, mas se fazem sentir na prática das relações sociais, na conduta profissional e nos códigos que determinam o bem estar de dada comunidade.

A partir deste ponto, e estabelecendo alguns contatos da própria epistemologia filosófica de Sócrates com a realidade moral e ética, podemos perceber suas contribuições para o avanço de uma discussão positiva a cerca da justiça.

Alguns estudiosos aproximam a identidade peculiar de Sócrates em fazer uso de gêneros diversos como os enunciados filosóficos e literatura com a tragédia grega, especificamente a de Sófocles em sua obra Antígona. Nesta relação, percebe-se uma preocupação com as leis, o que irá suscitar as problematizações a cerca do seu uso e encadeando reflexões sobre a própria estrutura social e seu bem estar. Observemos o contexto em que estão engendradas estas proposições segundo Jean Pierre Vernant e Pierre Vidal Naquet (1999, p.03):
(...) os gregos não tem a idéia de um direito absoluto, fundado sobre
princípios, organizado sobre um sistema coerente. Para eles, há como que graus
de direito. Num pólo, o direito se apóia na autoridade de fato, na coerção; no
outro, põem em jogo potências sagradas; a ordem do mundo, a justiça de Zeus.
Também coloca problemas morais que dizem respeito à responsabilidade do homem.
Desse ponto de vista, a própria Díke pode parecer opaca e incompreensível:
comporta, para os humanos, um elemento irracional de força bruta.
A representação da deusa da Justiça (Díke) acentua a idéia da citação acima, nos oferecendo uma visão de justiça irracional, moldada em valores voláteis, categorizados pela religião e pela sociedade. Esta dubiedade de justiça, ora violenta e irracional, ora proposta dentro de situações díspares, irá determinar a importância de Sócrates para a implantação dos seus valores de ética e virtude no seio da concepção de justiça.

Isto porque fará o filósofo refletir sobre a situação das leis no corpo social, dentro da vida cotidiana das cidades. Como se dá a implantação destas leis, sua obediência ou não por parte dos cidadãos, as penas devidas ao seu não cumprimento e tudo que estará diretamente ligado a justiça. Partir deste problema da concepção de leis e obediência social perante elas, é o ponto forte da filosofia de Sócrates no que tange a concepção de justiça. Fato que também é poeticamente abordado em Antígona. Na obra de Sófocles, Antígona estabelece uma relação de desobediência ao edito publicado pelo Rei Creonte, seu tio. (este edito proibia qualquer cidadão tebano de oferecer honras funerárias ao morto Polinices, assassinado em combate contra o próprio irmão do Rei Creonte).

As leis a que os cidadãos das Polis estavam inseridos eram emanadas de dois pólos: um religioso (deuses) e outro das próprias cidades-estados (Polis). Desrespeitar um é o mesmo que desrespeitar o outro, tendo em vista que a as leis dos deuses alicerçava a conduta no cosmos e as leis dos homens serviam para manter a ordem das cidades. O cidadão das polis tinha que se flexibilizar entre estes dois pólos, tendo em vista que era considerado cosmo-politas. Um cidadão da cidade enquanto universo. Podemos sintetizar este parágrafo afirmando que existiam as leis divinas e as leis humanas regendo a comunidade das polis.

Na tragédia de Sófocles, quando Antígona decide desobedecer o edito de Creonte e oferecer as honras funerárias a Polinices, ele passa a desobedecer a lei humana. Levado pelos guardas, argumenta em sua defesa que pela lei dos Deuses, qualquer morto deve e tem como direito receber as honras funerárias. Nesta medida, percebe-se que existe a transgressão de Creonte aos princípios e leis dos Deuses, quanto erige a nómos da proibição das honras funerárias. Por outro lado, Antígona rompe com a nómos da pátria, ao desobedecer uma lei do Rei e sua representação dentro da cidade grega. É o primeiro momento narrado onde existe um conflito entre a lei humana e a lei divina, conflito que se desdobrará na própria condição de direito público e privado. É o confronto entre o mundo divino e humano, entre a condição social e a condição religiosa, ou da própria representação de Díke e a dureza de sua espada.

A necessidade de descrever o ponto nodal desta tragédia de Sófocles é para ilustrar os princípios de confronto das leis no que tange sua acepção religiosa e humana. Isto porque em Sócrates, precisamente em sua obra "Apologia" (sua defesa em relação aos “acusadores antigos” e “acusadores atuais”) o filósofo remete a dubiedade de aceitar o contrato firmado com os Deuses, Apolo no caso, e um contrato de aceitação da ordem jurídica social, representada pelos juízes, suas leis e suas interpretações, bem como de suas sentenças. Este confronto fica ainda mais claro quando dado a restrição a Sócrates de uma possível sentença onde o mesmo não poderia mais filosofar, e entre esta e beber o veneno mortal, o filósofo afirma que enquanto respirar, não acatará a sentença proferida, uma vez que tinha um contrato divino com a verdade. Esta negação da ordem das leis no que tange a sociedade em prol de uma lei universal, esta busca da verdade, implica em uma concepção de justiça ligada à virtude e a moral individual. Acusado por “perscrutar o que está sobre a terra e sob o céu[2]”, em um sistema legal de sua própria criação, ofereceu-se como exemplo da própria atuação das leis. A questão é que sua obediência está ligada ao princípio ético universal, a verdade. Para Sócrates a lei é o limite entre a civilização e a barbárie.

O pensamento socrático, como afirma Bittar e Almeida (2005, p.65), é profundamente ético. Esta preocupação com a ordem social, com as atitudes de um coletivo em função de uma moral individual permeiam toda a sua obra, que está engendrada sob uma perspectiva prática, tanto nas ações do próprio filósofo, quanto no seu modo de pensar a justiça e interação social.

Esta preocupação com as leis e a convivência nas cidades-estado (polis) é responsável por oposições centrais ao pensamento dos sofistas, que viviam atrelados à retórica e à denominada “razão menor”; bem como aos pré-socráticos, que investigavam a natureza e a constituição íntima das coisas.

Para compreender sua concepção de justiça é antes necessário perceber como o filósofo encarava a ética. Em uma leitura de Bittar e Almeida (2004, p.65) indica que sua ética estava ligada ao conhecimento e a felicidade. Um julgamento convincente do que vem a ser bem e mal passará indissociavelmente pelo conhecimento, assim como a felicidade é proveniente dos deuses, baseada na virtude. Sócrates considera a virtude com o controle efetivo das paixões e a condução das forças humanas rumo ao saber.

[1] PANDOVANI, Humberto e CASTAGNOLA, Luís. História da Filosofia. 3ª edição. São Paulo: Melhoramentos, 1958.
[2] Símbolo dos sofistas, que procuram a razão menor (sofisma) em detrimento da razão maior, plena.

Comentários

Rapaz, que beleza. Você tá metido mesmo. Texto explorando filosofia desse tanto. Bão bão!
Everaldo Braun disse…
Este comentário foi removido pelo autor.
Everaldo Braun disse…
Excelente Artigo!
A Tragédia Grega de Sófocles é um ícone da Filosofia Jurídica, que eu particularmente gosto muito de estudar.
Parabéns...

Everaldo Braun
Direito-2º B
Anônimo disse…
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